Um novo polo de pecuária no norte

O Pará tem atraído pecuaristas de várias regiões do Brasil e hoje possui o quarto maior rebanho bovino do País, estimado em 15 milhões de cabeças, concentradas principalmente no sul e sudeste do Estado, com 9 milhões de animais. “O Pará é um grande banco de genética. Entre todos os Estados é o que mais tem investido”, garante o pecuarista Marco Marcelino de Oliveira, do Grupo Campo de Boi. “Cerca de 60% dos animais ofertados nos grandes leilões de Uberaba (MG) são comprados por criadores do Pará”, diz o criador. Só para ilustrar, ele informa que animais da Fazenda Cedro, pertencente a Benedito Mutran, e da Fazenda Arataú, do Grupo Queiroz Galvão, ambas no Pará, venceram os três últimos grandes campeonatos da ExpoZebu. “Nas fêmeas, o resultado tem sido extraordinário, tanto no nelore-padrão como no mocho.”

Há 40 anos, Marcelino de Oliveira saiu da Paraíba e desembarcou no Pará com o propósito de fundar a divisão agropecuária de uma multinacional da área veterinária. “Cheguei, gostei, fiquei, casei e comprei fazenda e gado”, conta. Gostou tanto que atualmente possui 10 mil animais, sendo 1.700 matrizes registradas. Dessas, 276 doadoras. Os animais de corte são criados em pastagens de braquiarão e quicuio e os produtos de genética são confinados.

“A elite da pecuária nacional tem fazenda no sul do Pará”, afirma o paulista de Guará Cesar Luiz Rodrigues de Freitas, dono do Frigo Class, com duas unidades, uma em Marabá (PA) e outra em Promissão (SP) – o antigo Frigo Dias, recém-inaugurado –, ambas liberadas para exportação.

Segundo o paulista José Francisco Diamantino, o rebanho paraense é muito bom e está crescendo em qualidade e quantidade. “Os pecuaristas da região são todos competentes e tradicionais”, diz. “São, na sua maioria, de São Paulo, Paraná e Minas Gerais, trabalham muito bem a questão de sanidade e procuram a precocidade dos animais.” Nesse aspecto, ele diz que, há cinco anos, o Estado era classificado como de “risco desconhecido” pelo Ministério da Agricultura, em relação ao controle da febre aftosa. Com um trabalho persistente dos produtores e apoio do governo, o Estado evoluiu, passando para alto e médio riscos. “Esperamos, este ano, alcançar o status de livre de aftosa, com vacinação.”

Diamantino usa tecnologia de ponta: inseminação artificial, transferência de embriões, acasalamentos dirigidos e fecundação in vitro. Ainda novo, saiu de São Paulo, com os pais, para o Paraná. “Soubemos que o Incra estava abrindo a Transamazônica e estava doando lotes pequenos e vendendo lotes maiores, por meio de licitação”, conta. “Compramos as primeiras terras em Altamira e iniciamos a criação de gado há dez anos.” Depois, montaram uma concessionária de automóveis em Marabá. Foram crescendo, aumentando as terras e adquirindo tecnologia. “Copiamos o modelo de Benedito Mutran, um fazendeiro da região, pioneiro em embriões e acasalamento”, diz. Contrataram técnicos da região e especialistas em melhoramento genético, entre eles o veterinário Maurício Teixeira. Depois incorporaram à equipe um especialista em reprodução animal, Joaquim Correia, que a cada 30 dias visita a fazenda e hoje faz a parte de transferência de embriões. Na mesma visita ele dá assistência a mais dois criatórios: o de Benedito Mutran e o da Fazenda Arataú.

De acordo com o pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, coordenador do Núcleo da Embrapa em Marabá (PA), Raimundo Nonato Brabo Alves, na região predomina a pecuária extensiva, basicamente com o gado nelore. “Em genética a região está bastante avançada, os pecuaristas estão na frente”, observa. “Tanto que hoje as pesquisas estão voltadas para o melhoramento e a diversificação de pastagens.” Predomina na região o pasto de capim quicuio, do gênero braquiária, principalmente o braquiarão. Mas já estão ocorrendo problemas, como morte de pastos de braquiarão, por causa da falta de fertilização.

Alves afirma que, segundo estimativas, a Amazônia Legal tem 1 milhão de hectares de pastagens degradadas e, por isso, há três anos, o foco dos trabalhos da unidade voltou-se para a integração pecuária-agricultura, visando a elevar a produtividade da pecuária com o plantio de grãos. Como vantagens do sistema, o pesquisador cita a recuperação das pastagens degradadas por meio da fertilização do solo, o aumento da capacidade de lotação e da produção de carne por área. No aspecto econômico, um dos benefícios apontados por Alves é a estabilidade econômica, com o crescimento da pecuária de corte e de leite e a produção de soja, milho, arroz, feijão e sorgo. Em termos ambientais, Alves explica que o sistema ajuda a reduzir a pressão sobre as florestas, aumentando a produtividade pecuária nas áreas nas quais já existe a atividade.

Os pecuaristas do Estado vendem boi em pé para o mercado regional e Nordeste. Já os frigoríficos comercializam carne na região e enviam carne desossada para São Paulo. Levando em conta a localização do Estado em relação aos mercados europeu e americano, os pecuaristas estão apostando na queda das barreiras sanitárias, em breve.

Segundo Roque Quagliato, do Grupo Irmãos Quagliato, que possui várias fazendas na região, o problema das barreiras continua sendo um entrave para as exportações. Ele conta, porém, que, em maio deste ano, dez criadores conseguiram liberar a exportação de 2 mil nelores cruzados vivos para o Líbano, uma negociação encabeçada pelo Frigorífico Minerva, de Barretos (SP). Ele enviou 308 animais do seu rebanho. “O gado foi embarcado no Porto de Barcarena, vizinho a Belém (PA), e seguiu viagem por 21 dias até o destino”, informa, acrescentando que os animais foram transportados em caminhões pela Rodovia PA-150 “Estamos realizando estudos sobre a logística de transporte, pois comprador para nosso gado existe.”

Freitas, dono do Frigo Class, considera a carne paraense de boa qualidade e macia. Ele abate, em média, 800 bois por dia na unidade de Marabá e 300 bois por dia em Promissão. A carne dos animais abatidos pelo seu frigorífico é distribuída nas grandes capitais: Recife, Fortaleza, João Pessoa, Natal, São Paulo e Rio. Na região, explica, o boi vai para o abate aos 32 meses com 18 arrobas, em média. As vísceras brancas (bucho, testículos, aorta) são enviadas para a China, e o dianteiro, para o Oriente Médio. Já o couro cru é vendido em Redenção para a Bracol, empresa do Grupo Bertin. “O couro é curtido no Pará, de onde é exportado para a Itália, pelo Bertin.” Freitas também cria gado na região, onde possui seis fazendas, na região de Redenção, no total de 38 mil hectares e 30 mil cabeças de nelore comercial.

O médico veterinário de Mococa (SP) Fernando Galvani deixou São Paulo, em 1995, para prestar assistência às fazendas de gado do Tocantins.

Vislumbrando o potencial do agronegócio no Pará, em outubro de 2002 ele montou em Marabá (PA) uma empresa de consultoria e prestação de serviços ao agronegócio, especialmente na área veterinária e de alimentos. “No Pará tem tudo o que um pecuarista quer: terra barata, índice de chuvas ideal e capim espetacular”, enumera. “Quem quer crescer, ganhar dinheiro e buscar novas oportunidades, vem para cá.”

Galvani conta que decidiu ir para o Pará depois de ser contratado para dar assessoria à Agropecuária Corona, de Amílcar Yamin, que tem um criatório na região. Hoje, a sua empresa, a Vet Plus, atende a criadores de peso na pecuária nacional. Um deles é o Grupo Revemar, de nelore, de José Francisco Diamantino. Outro é José Coelho Vitor, o “Cabo Verde”, de Passos (MG), da Fazenda Santa Lúcia, em Xingura (PA), onde cria tabapuã, gir e nelore. “É o maior tirador de leite B de gado cruzado do Brasil”, diz Galvani. Segundo explica Galvani, o gir puro é cruzado com o holandês, no Pará. “Esse cruzamento dá boas girolandas que são vendidas pelo criador, em Passos.”

Galvani também orienta produtores de genética, como a Fazenda Caracol, de Tharley Elvecio Alves, com um rebanho de nelore puro, que passa por avaliação genética em Redenção (PA) e participa do Programa de Melhoramento do Nelore, coordenado pelo professor Raizildo Lobo, da USP de Ribeirão Preto (SP). Outro produtor de genética nelore é a Fazenda Vale do Boi, de Epaminondas de Andrade. “É uma das que usam mais tecnologia na região”, diz Galvani, que acrescenta: “Faz ponderal há três anos na Associação Brasileira de Criadores de Zebu.”

(Estadão/SP) – Quarta feira, 16 de julho de 2003
Notícia adaptada pela equipe do Boletim Agropecuário

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